Ultimamente tenho lido e escutado sobre a
“Guerra do Contestado” e as comemorações do seu centenário. Observei que há
anos, o assunto não sai da boca de algumas pessoas. São historiadores,
pseudo-historiadores e moradores da região, onde o conflito ou a chamada “guerra”
aconteceu. Elas, de certa forma, tentam sempre tornar vivas, as muitas
histórias que lhes foram transmitidas.
Meu artigo é um alerta sobre o assunto.
Posso estar enganado, mas creio que não. Com o passar dos anos, alguns
personagens, fatos e também os lugares, transformaram-se de concretos para
abstratos, se incorporando nas folclóricas tradições regionais. Na quaresma,
depois de 100 anos, ainda encontramos procissões, recomendas, responsos e rezas.
Também encontramos algumas bizarrices que foram acrescentadas a todo o quadro
místico, cada vez mais encorpado conforme os anos passaram. As distorções,
adições ou subtrações dos fatos podem levar-nos a uma outra realidade, bem
distante do que realmente aconteceu aqui. Chamo a atenção, ao lembrarmos dos
eventos, para preservarmos os fatos como ocorreram, sem diminuir ou
acrescentar.
Da mesma forma como aconteceu com vários
santos católicos, que viveram ao redor do mundo, é bem provável que daqui há
não sei quantos anos, apareça algum milagre atribuído a um destes monges do
Contestado. Ou até mesmo, quem sabe, atribuída a uma das virgens que, segundo
nos foi passado, tinham visões celestiais e davam instruções divinas ao
exército de jagunços. Já não falta e não faltará quem cultue estes personagens.
Está faltando muito pouco para isso, pois há décadas já existe na região, uma
seita, com pessoas que peregrinam e oram na “quaresma”, invocando as “almas”.
Se quisermos nos orgulhar de nossos antepassados, que viveram ou participaram
do conflito, devemos atentar para os fatos e não para as lendas.
Em nossos dias, cada vez mais cheio de
ferramentas para difusão do conhecimento, tudo o que não precisamos é de
confusão cultural. Principalmente porque não queremos que nossos descendentes
acreditem em mentiras. É fato que os jovens de hoje são mais espertos e não
engolem qualquer história sem questionarem, o que não se via em nossos idos
tempos de juventude.
Essa região do Contestado foi, por mais de
um século, uma região com um grande índice de pessoas culturalmente pobre. As
cidades até o dia de hoje figuram, na sua maioria, no final da lista do Ranking
do Índice do Desenvolvimento Humano. O cunho extrativista da araucária, uma característica
regional, dava a falsa ideia de desenvolvimento. Isso é fato! Nós podemos
comparar a região do Contestado com o desenvolvimento das cidades do litoral,
onde não foram implantados crendices na cabeça das pessoas. E onde não usaram o
extrativismo como única fonte de geração de riquezas.
Acho extremamente importante conservarmos
a memória do “Conflito do Contestado”. Mas dentro de uma racionalidade
aceitável. É oportuno ensinar que tanto os gananciosos invasores, como os
moradores que viviam na região, que foram afetados pelas exigências
capitalistas, na construção da Estrada de Ferro São Paulo até o Rio Grande do
Sul, foram personagens reais. Homens comuns e que Deus nunca teve nada a ver
com um ou outro lado dos envolvidos. Nem estava do lado do Padre Frei Rogério,
nem ao lado dos Monges ou das Virgens, se bem que ambos oravam para a mesma
divindade. Não temos evidências de que Deus tenha favorecido um ou outro. Os invasores
queriam destruir a floresta em troca de dinheiro e por ganância. Os moradores
também eram extrativistas. Dentro de um controle demográfico, poderiam
subsistir, sem danos aparentes. Mas isso seria apenas por um período de tempo.
Se não houvesse o conflito, eles se multiplicariam, negociariam e acabariam por
também destruir a floresta. Consumiriam a floresta, com toda a sua fauna e a
flora, mesmo que isso levasse 100 anos. Fica o meu alerta, antes de divulgarmos
algo sobre o Contestado sem a devida comprovação. História é história, merece
respeito!
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