quinta-feira, 3 de novembro de 2022

A HISTÓRIA DOS SAMPAIOS


Texto de Antonio Carlos Popinhaki


Na vila de Curitibanos, no ano de 1912, havia um comerciante de nome João Alves de Sampaio, estimado por todos os moradores. Ele tinha uma casa comercial, concorrente com o armazém do Coronel Francisco Ferreira de Albuquerque, o superintendente da época. Entretanto, apesar da concorrência, inicialmente, eram aparentemente, aliados políticos. Visto que na lista de doadores para implantação do Jornal “O Trabalho”, o Capitão João Alves de Sampaio figurava com uma doação de 100 mil réis. Consta que esse João Sampaio, além de aliado político, era admirador do superintendente e procurava segui-lo, inclusive, nas suas decisões pessoais e modas. Se Albuquerque comprava um par de botas de um determinado modelo e feitio, pouco tempo depois, João Sampaio estava vestindo uma igual, levando-nos a crer que a amizade era tamanha, que chegava até a extrapolar a linha da intimidade entre Albuquerque e a família de João.

Costumeiramente, de tempos em tempos, o comerciante precisava ir a Florianópolis e outros centros fazer compras de mercadorias para abastecer a sua loja. Uma viagem até Florianópolis naquele tempo, demorava cerca de 20 a 30 dias a cavalo, quando não eram molestados pelos índios, que viviam às margens dos caminhos e carreiros. A estrada para uso de carroças só estava pronta de Aquidaban (Apiúna) em diante, até a capital. De Apiúna em direção ao Oeste, era só carreiro fundo pelo tanto passar de cavalos, mulas e pessoas a pé. Então, quando o comerciante João Sampaio viajava, Albuquerque o substituía na loja comercial e também na cama, pois o superintendente conseguiu seduzir a esposa de João Sampaio para que cometesse adultério. Certa vez, quando estava com a esposa do amigo, Albuquerque foi flagrado por um empregado da casa, de nome João Knoll, logo de manhã cedo, quando saía. O empregado, fiel ao patrão, disparou o revólver em direção ao superintendente, errando o tiro. A notícia espalhou-se rapidamente na vila até chegar aos ouvidos do padre, que na época era Frei Gaspar.

Toda a família Sampaio ficou solidária a João. Logo, todos foram hostilizados pela polícia municipal. A crise aumentou, quando o jovem Marcos Alves de Sampaio, que tinha na época, mais ou menos 14 anos, passou na frente da casa de Albuquerque com um revólver na cinta. Foi logo cercado e preso por cinco policiais. Na tentativa de desarmá-lo, um soldado chamado de Leite e que tinha muito medo de cobra, ao colocar as mãos no menino disse:

ー Entrega o revólver!

ー Olha a cobra Leite! — Respondeu rápido, Marcos Sampaio.

O soldado deu um pulo para trás assustado. Foi o tempo exato para que o jovem Marcos acertasse-lhe um tiro no peito, caindo morto. Os demais policiais o perseguiram até a casa de João Sampaio. Marcos acabou sendo preso e foi a julgamento. Henrique Rupp Júnior, o advogado de Campos Novos, assumiu a defesa do rapaz e transferiu o processo para ser julgado na vila de Campos Novos. Marcos foi inocentado no júri, então voltou para Curitibanos, sendo recebido por cerca de 200 cavaleiros com tiros para cima. A alegria foi generalizada, culminando em poucos meses, com a entrada dos Sampaios para a “Irmandade Cabocla” de fanáticos do Taquaruçu, em veemente oposição a Albuquerque.

Num domingo após a divulgação pública pelas várias bocas, sobre o adultério de Albuquerque com a esposa de João Sampaio, na missa, na hora do sermão, Frei Gaspar falou da santidade do matrimônio e do valor da vida humana, sem, contudo citar nomes. O Superintendente compreendeu o recado, iniciou-se então, uma violenta campanha contra Frei Gaspar, com acusações de loucura, atrevimento e de fazer política. Albuquerque mandou telegramas ao bispo de Florianópolis, ao Governador Vidal Ramos Júnior e até um abaixo-assinado ao Ministro Provincial da Província Franciscana da Igreja Católica.

A família Sampaio nunca mais teve paz em Curitibanos. No ano de 1916, após a prisão do último líder da Irmandade Cabocla, Adeodato Manoel Ramos, João Alves Sampaio mudou-se para a cidade de Passo Fundo, com a finalidade de recomeçar sua vida naquele povoado, antes disso, fez publicar seguidamente na imprensa escrita catarinense uma nota:


Despedida

O abaixo assinado não podendo despedir-se pessoalmente de todos os seus parentes e amigos por falta de tempo, faz por este meio, indo residir na cidade de Passo Fundo, Estado do Rio Grande do Sul, onde estará às ordens de seus amigos e parentes. Não faz esta mudança voluntariamente e sim por força de circunstâncias, pois é filho de Curitibanos, onde tem números parentes e amigos que tanto custa a separar-se deles; mas acontece que levou para ser seu compadre um monstro que fez a desgraça de sua família. Este, chama-se Francisco de Albuquerque, natural de Lages. Mas espero em Deus, que quando a justiça da terra faltar, a divina castigue este Nero. Adeus meus parentes e amigos, com desprezo aos perseguidores.

Curitibanos 26 de junho de 1916.

João Alves de Sampaio


A nota está numa das edições do Jornal O Estado. Entretanto, foi replicada em outros veículos de comunicação da época. João Sampaio, serviu de testemunha num pedido de habeas-corpus, proferido em favor de uma dezena de pessoas que viviam errantes em Curitibanos, perseguidos pela justiça local, atribuindo-lhes responsabilidades e participações nos redutos da Irmandade Cabocla. Isso fez com que a vida, em Curitibanos, fosse insuportável para a família Sampaio, justificando a sua ida para a cidade gaúcha.



Referências:


Despedida. O Estado, ano II, n.º 365. Florianópolis, terça-feira, 25 de julho de 1916, p. 3.


Justiça: Entrega de Autos. O Estado, ano I, n.º 11, Florianópolis, Quarta-feira, 26 de maio de 1915, p. 1.


Justiça Federal: O Estado, ano I, n.º 28. Florianópolis, terça-feira, 15 de junho de 1915, p. 2.


Superior Tribunal de Justiça: Pedido do Dia. O Estado, ano I, n.º 20. Florianópolis, sábado, 5 de junho de 1915, p. 2.


POPINHAKI, Antonio Carlos. Francisco Ferreira de Albuquerque. Blog Curitibanenses. On-line, disponível em: https://curitibanenses.blogspot.com/2018/03/francisco-ferreira-de-albuquerque.html





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