Texto de Antonio Carlos Popinhaki
No ano de 1967, meu pai, Pedro Popinhaki, decidiu abandonar de vez a dependência financeira de seus irmãos. Os rendimentos já não eram suficientes para sustentar nossa família numerosa. Seu irmão Antonio, num gesto de generosidade, cedeu-nos um imóvel sombrio, sem cobrar aluguel. Foi ali, na Rua Pedro David Fernandes de Souza, que começamos a escrever uma nova página de nossas vidas.
Naquele ano, surgiram duas oportunidades de trabalho para meu pai: motorista de uma Kombi-circular, que fazia parte do novo sistema de transporte coletivo em Curitibanos, ou motorista de uma das caçambas da Prefeitura Municipal. Lembro-me como se fosse hoje: numa manhã qualquer, ainda debaixo das cobertas, meu pai me perguntou, brincando: “Em qual serviço você quer que o papai trabalhe? Com a Kombi ou com a caçamba da Prefeitura?”. Eu, com meus seis anos de inocência, respondi prontamente: “Com a caçamba, papai!”.
E foi assim que Pedro Popinhaki tornou-se um dos motoristas da frota municipal. Dirigia um Ford F-600, azul, com o número 6 estampado nas portas. Aquele caminhão era seu orgulho. Às vezes, ele nos levava para o trabalho, e eu e meus irmãos ficávamos na cabine, observando o vai e vem das ruas de Curitibanos sendo pavimentadas com paralelepípedos. As viagens para buscar areia nos locais de extração, como a Lagoinha e o Rio Marombas, eram uma aventura para nós, crianças.
Mas nem tudo eram flores. A vida era dura, e as responsabilidades chegavam cedo. Aos cinco anos, eu já tinha a tarefa diária de buscar leite para a família. Com um litro de vidro vazio nas mãos, eu caminhava até a casa do vizinho, na Rua Coronel Marcos Gonçalves de Farias. Certa manhã, o litro escorregou de minhas mãos e quebrou-se ao bater numa pedra. O choro foi instantâneo. Eu sabia que minha mãe, enérgica e rigorosa, não toleraria desperdícios. Mas, para minha surpresa, ela não me repreendeu. Ficamos sem leite naquele dia, e no dia seguinte, meu pai foi comigo buscar leite com um litro novo.
Aquele bairro onde morávamos era assustador. Mato, terrenos baldios e casas esparsas. À noite, os bêbados da “Rua dos Pobres” passavam por nossa casa, e o medo era constante. Um vizinho, Salvador Guerria, um veterano da Guerra do Contestado, contava histórias que eu mal entendia, mas que me fascinavam. Seu neto, um adolescente, às vezes cuidava de mim e de meus irmãos quando meus pais iam ao cinema. Juntos, brincávamos de construir carreiros, imitando o trabalho dos operários da prefeitura de Curitibanos.
Meu pai, apesar das dificuldades, era um homem de coração enorme. Bondoso, carismático, amigo de todos. Sua falta de estudo formal nunca o impediu de lutar por nós. Em 1967, ele finalmente conseguiu um emprego estável na prefeitura, e aquela caçamba azul tornou-se um símbolo de sua dedicação.
Hoje, ao olhar para trás, vejo que aqueles anos simples e difíceis moldaram quem sou. As ruas de paralelepípedos, o cheiro da areia fresca, o barulho da caçamba basculante e até o gosto do leite fresco, tudo isso faz parte de mim. São memórias que não se apagam, lembranças de um tempo em que a vida era dura, mas cheia de significado.
E, no centro de tudo, está meu pai, Pedro Popinhaki, um homem que, com suas mãos calejadas e seu coração generoso, nos ensinou o valor do trabalho e da perseverança.
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