sábado, 26 de outubro de 2024

UMA CASA ASSENTADA SOBRE UMA CAÇAMBA DA PREFEITURA DE CURITIBANOS



Texto de Antonio Carlos Popinhaki


A seguinte história é verídica e aconteceu na primavera de 1969. Para escrever sobre o assunto, precisei da ajuda de um ex-colega de trabalho do meu pai, o senhor Apolinário Alves Pereira, que hoje está com mais de 90 anos, porém, muito lúcido.

Nessa época, o meu pai, Pedro Popinhaki, morava com sua família, numa velha casa localizada na Rua Pedro David Fernandes de Souza, saída para a antiga Rua dos Pobres, hoje, Bairro São José. O imóvel pertencia a Antonio Popinhak, que cedeu o lugar para a moradia do seu irmão mais velho, não lhe cobrando nenhum aluguel. Em 1967 apareceu uma oportunidade para trabalhar como motorista de uma das caçambas da Prefeitura Municipal de Curitibanos.

Não esqueci desse fato. Eu deveria ter uns seis anos. Eu estava na cama com meu pai, numa manhã qualquer, ainda debaixo das cobertas, ele, brincando comigo, perguntou-me:

— Você quer que o teu pai trabalhe com a caçamba da prefeitura?

— Sim, papai! — respondi prontamente.

É claro que eu não poderia influenciá-lo na sua decisão. Talvez nem ele mesmo estivesse seguro de que a vaga seria ou estaria garantida, simplesmente porque para arrumar um emprego é necessário que o patrão queira contratar. Mesmo assim, lembro de dizer-lhe que queria que ele trabalhasse com a caçamba.

Não demorou muito e Pedro Popinhaki já era um dos motoristas da frota da Prefeitura Municipal de Curitibanos. Deram-lhe uma das caçambas basculantes para que a dirigisse. Um Ford F-600, da cor azul. Ainda lembro dessa caçamba. Na época, era um caminhão novo, ano de fabricação: 1967 e tinha o n.º 6 estampado nas portas. Depois que ele entrou para o seleto grupo de motoristas da prefeitura, meu pai trabalhou com outros veículos (carro fúnebre e o caminhão que recolhia o lixo urbano), sendo mesmo titular do Ford F-600.

Quando ia almoçar, Pedro sempre deixava o veículo em frente ao portão da nossa casa. Às vezes, nos levava juntos para o seu trabalho. Ninguém, das pessoas que estavam acima na hierarquia do setor público, reclamava dele por levar consigo os seus pequenos filhinhos para o serviço. Ficávamos sempre na cabina.

Naquele tempo estavam pavimentando com paralelepípedos várias ruas de Curitibanos. Os motoristas das caçambas da prefeitura iam constantemente buscar areia para colocarem sob as pedras do calçamento (paralelepípedos), também chamados comumente de “macacos”. A prefeitura de Curitibanos tinha alguns lugares especiais de onde retiravam essa areia fina. Havia um local na Lagoinha, próximo ao Rio Marombas, e outro na localidade Marombas, no lado esquerdo da antiga ponte de concreto, na estrada que ia para Lebon Régis.

O prefeito da época era o senhor Wilmar Ortigari, pessoa enérgica que fiscalizava pessoalmente cada obra, sendo a maioria delas abertura e pavimentação de ruas. Eram várias viagens diárias de areia para as ruas de Curitibanos. Hoje, a Avenida Frei Rogério, em frente ao Colégio Santa Terezinha, é pavimentada com asfalto, mas antes desse asfalto, era pavimentada com paralelepípedos. Sob essas pedras havia areia, que fora trazida dos locais mencionados, parte delas transportadas pela caçamba basculante dirigida por Pedro Popinhaki.

Certa vez, na primavera de 1969, estavam na encosta do Rio Marombas o senhor Apolinário Alves Pereira, que também era o motorista de uma caçamba basculante, meu pai, e o operador da carregadeira da prefeitura, o senhor Reny Pereira. Era um dia de calor e estava se “armando” uma tempestade, daquelas chamadas de “chuvas de verão”, apesar de ser primavera. O senhor Reny carregou de areia as duas caçambas. O senhor Apolinário olhou para uma das rodas da caçamba do meu pai e falou-lhe:

— Pedro, está vazando os prisioneiros da tua roda. — Informando-lhe que estavam frouxos ou quebrados. Só tinha dois que estavam bem apertados.

Aqui cabe uma explicação: prisioneiros são parafusos especiais utilizados para fixar as rodas de caminhões. Eles são essenciais para garantir a segurança e o bom funcionamento do veículo, pois mantêm as rodas firmemente presas ao eixo. Entre as funções dos prisioneiros estão a segurança, pois eles impedem que as rodas se soltem durante a movimentação do caminhão, evitando possíveis acidentes; e a estabilidade, pois contribuem para uma direção segura. São chamados de prisioneiros pelo fato de que eles "aprisionam" as rodas ao eixo, impedindo que elas se movimentem livremente.

Pedro, ao ouvir as palavras de Apolinário e prestando atenção na tempestade que se aproximava, respondeu-lhe:

— Vou tocar assim mesmo, chegando lá em Curitibanos, os mecânicos da prefeitura vão arrumar.

Conforme as lembranças do senhor Apolinário, "o tempo ficou muito feio", a tempestade era assustadora. Apolinário dirigia sua caçamba para Curitibanos à frente e Pedro, dirigindo a outra, vinha atrás. O local da descarga era no bairro São Luiz, onde estavam executando obras de pavimentação com paralelepípedos.

Tanto Apolinário como Pedro ficaram muito preocupados e temerosos pela segurança de suas famílias, que estavam em casa devido à tempestade de ventos, raios e chuva intensa. Resolveram ver se suas esposas e filhos estavam bem, passando carregados pelo bairro São Luiz, pelo local da descarga. Após constatarem que tudo estava bem com as famílias, os dois motoristas foram descarregar a areia. Pedro Popinhaki, ao dirigir-se para o Bairro São Luiz, optou por subir o morro da Rua José Francisco de Carvalho, rua paralela à Rua Dr. Lauro Müller. As razões porque ele optou por essa via são completamente ignoradas. O que sabemos é que há uma subida complicada e que exige certa habilidade do motorista.

Na acentuada subida daquela rua, com a primeira marcha engatada quase no início do morro, estouraram os dois prisioneiros da roda da caçamba que estavam fixos. As rodas não chegaram a se soltar, mas ficaram frouxas, sem freio. Pedro não conseguiu dominar o pesado veículo sem o freio necessário, e ele desceu de ré, desgovernado, até entrar no porão de uma residência, arrancando um dos cepos altos centrais da casa, fazendo com que ela (a casa) assentasse sobre a caçamba e a carga de areia. O imóvel estava localizado no lado esquerdo da subida; se Pedro tivesse virado o volante para o outro lado, teria caído num terreno íngreme com várias casas localizadas na parte de baixo.

O proprietário da casa era o senhor Isaías Mendes, filho do senhor Napoleão Mendes. Isaías era alfaiate em Curitibanos. Naquele momento, ele estava em casa dormindo, apesar da chuvarada, devido a uma bebedeira de cachaça num bar. Levou o maior susto. A confusão foi generalizada; chamaram até fotógrafo para registrar o fato. Pedro não pôde fazer mais nada a não ser deixar a caçamba e a carga de areia sob a casa do senhor Isaías Mendes. Somente no dia seguinte, o prefeito de Curitibanos mandou algumas pessoas com um macaco para suspender a residência e tirar a caçamba debaixo dela. Conforme as lembranças do senhor Apolinário, o prefeito considerou um acidente normal de serviço, não dando nenhuma bronca no senhor Pedro Popinhaki.

A fotografia desta publicação mostra Pedro Popinhaki com sua família, em 1968, ao lado da Praça da República. Sobre o capô quente daquele dia, estava o autor deste texto e irmãos.



Referências para o texto:


Com informações do senhor Apolinário Alves Pereira


Com informações da senhora Adriana Aparecida Pereira, filha do senhor Reny Pereira


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