terça-feira, 21 de novembro de 2023

A CASA DA CÂMARA E CADEIA DE CURITIBANOS


Texto de Antonio Carlos Popinhaki


As Casas da Câmara e Cadeia ou Casa de Câmara e Cadeia, eram edifícios da época do Brasil Colônia, época imperial e início da era republicana. Nesses edifícios estavam estabelecidos e instalados os órgãos e pessoas pertencentes à administração local, como o superintendente e seus conselheiros ou vereadores. Também trabalhavam no local, o chefe de polícia e carcereiros. Era grande o suficiente para abrigar, além das autoridades já citadas, o “Juiz de Fora”, que era um juiz nomeado pelo imperador para resolver, imparcialmente, conflitos ou questões complicadas. A principal função do “Juiz de Fora” era zelar pelo cumprimento da justiça, representando a vontade do imperador. Ainda, deveria haver lugar na Casa da Câmara e Cadeia para abrigar o Procurador, o Juiz de Direito e o tribunal, onde eram realizadas as audiências. 

Na região que hoje está localizado o Estado de Santa Catarina, em 1856, quando ainda era chamada de Província de Santa Catarina, havia intensas conversas, inclusive, publicadas em jornais da época sobre a construção de Casas da Câmara e Cadeia nas vilas de São José, Itajaí e Campos Novos. Naquele tempo, o orgulho dos catarinenses era a  Casa da Câmara e Cadeia da vila de Laguna, construída em 1747. Hoje, esse edifício abriga o Museu Anita Garibaldi. Na época, possuía um sino, ao alto da escada de acesso ao primeiro piso, acima da cadeia. Esse sino servia para marcar as audiências e chamar os jurados. Ainda, servia para sinalizar o horário de funcionamento do comércio local e a hora do recolhimento dos escravos.

Em geral, as Casas da Câmara e Cadeia eram construídas em estilo português, com portas e janelas arredondadas, caixilhos de madeira e cobertas com telhas coloniais, tipo canudo. Geralmente o local onde esses edifícios eram construídos, era o centro urbano das vilas, no largo do pelourinho ou ainda, no chamado “rossio”. Essa palavra “rossio”, da forma como era escrita, significava um terreno largo e espaçoso, um terreno roçado. Portanto, ao redor do edifício, deveria haver um espaço para a eventual reunião da população, quando necessária e/ou convocada.

Ao lermos os textos dos antigos periódicos catarinenses, principalmente, os artigos do final do Império, percebemos que em 1881, na vila de Campos Novos, já havia sido construído o edifício administrativo, com todas as dependências necessárias para o abrigo das autoridades locais. No ano de 1883, na vila de Lages, o presidente da Província, autorizou a liderança local a desfazer-se da Casa da Câmara e Cadeia e de uma pequena casinha, que estava construída anexa, que servia de açougue, e todos os itens que acompanhavam o mesmo. A justificativa era atender a solicitação dos dirigentes de Lages, no tocante de que a Casa da Câmara e Cadeia e suas adjacências, já não estavam atendendo a demanda local. Haveria a necessidade da construção de um novo edifício, maior e com características que contemplasse o povo lageano, bem como, seus representantes. Conforme a escritora curitibanense Zélia de Andrade Lemos, Correia Pinto de Macedo, o fundador de Lages escolheu o lugar para a construção da Casa da Câmara e Cadeia em 1771. Se a informação estiver correta, o edifício construído pelo fundador de Lages era provisório ou precário, pois 12 anos depois estava com ordem de venda para a construção de uma nova sede administrativa.

Lemos também nesses antigos periódicos, que nem sempre era fácil a construção desses edifícios. Geralmente o repasse de verbas da esfera superior, como os da Província, ou mesmo do Estado (após a Proclamação da República) era escasso. Achamos casos em que foram necessárias a confecção de loterias, com a venda de bilhetes numerados para a população, para arrecadar dinheiro para a construção.

Em Curitibanos, temos informações, através dos escritos da escritora Zélia de Andrade Lemos, que a primeira Casa da Câmara e Cadeia construída para a instalação do município foi construída de madeira, de forma simples e com previsão de uso provisório. A instalação definitiva do município de Curitibanos, com a posse e juramento dos membros eleitos da Câmara e Conselho Municipal, bem como, a inauguração da sede administrativa, também chamada de “Paço Municipal”, se deu em 8 de abril de 1873. A Primeira Sessão da Câmara Municipal se deu em 7 de maio de 1873, sob a presidência de Theodoro Ferreira de Souza, primeiro Juiz Municipal, escolhido pela Câmara de Lages, ainda na ocasião do desmembramento do território em 1869.

Com a Proclamação da República, ocorrida em 15 de novembro de 1889, algumas novas regras e costumes foram implantados. Por exemplo, o desligamento da Igreja Católica, do Estado. Na época imperial, a Igreja ditava ordens e se intrometia nas decisões do Imperador. Também, em 1891, foi aprovada a primeira Constituição Republicana do Brasil, com alterações de nomes como, por exemplo, Província, para Estado. Encontramos que em Curitibanos, o senhor Henrique de Almeida (Sênior) foi nomeado pelo Então Governador do Estado, senhor Hercílio Pedro da Luz, através da Resolução Ordinária Estadual n.º 4.496, de 10 de janeiro de 1895, para ser o novo Superintendente Municipal de Curitibanos.

No cargo, Henrique Paes de Almeida (Sênior), tratou de construir a nova sede administrativa para a vila de Curitibanos, com todas as exigências e as características necessárias. O edifício não existe mais, entretanto, segundo a escritora Zélia, “era um edifício em estilo colonial, feito de estuque, cujo aspecto muito se assemelhava à alvenaria”. Esse prédio substituiu a velha Casa da Câmara e Cadeia, construída em 1873, de madeira. A nova foi dotada de conforto e beleza, possuindo na sala da Câmara, cortinas de rendas e lustres de cristal. Esse edifício também era chamado de Intendência e/ou Superintendência. Ficava instalado num local próximo à Praça da República, ao lado da primeira Igreja Matriz. Quando ficou pronto, em 1901, por ser a melhor construção do lugar, foi motivo de orgulho aos curitibanenses.

As informações da sua inauguração estão registradas na edição do dia 17 de setembro de 1901, do jornal “O Dia”. Diz a nota na terceira página daquela edição que no dia 20 de agosto de 1901, aconteceram várias solenidades alusivas à inauguração do edifício do Governo Municipal de Curitibanos. A inauguração aconteceu no período da tarde, entretanto, desde o meio-dia, até a hora marcada para a Reunião do Conselho, em Sessão Solene, com o objetivo da tomada de posse, de maneira oficial, do novo prédio, houve ininterruptos foguetórios na vila, com aclamações contínuas do Partido Republicano, do qual fazia parte o Superintendente local, Henrique Paes de Almeida (Sênior).

Por volta das 14 horas, o Presidente do Conselho, o senhor Salustiano Pinto de Andrade, que assumiu o cargo após 1895, nomeou 2 membros da corporação municipal, que se encontravam no local, e os designou para adentrarem no novo edifício. O objetivo era que os 2 homens vistoriassem o prédio definitivamente e verificassem se não haveria nada ou nenhum empecilho que pudesse frustrar o ato inaugural. Conforme o editor do jornal de Florianópolis, “o prédio, que, sendo constante e diariamente fiscalizado, não tinha nada para tal vistoria, nem seria necessária tal determinação.

No início da solenidade de inauguração, o Presidente do Conselho, o senhor Salustiano Pinto de Andrade, ao discursar, chamou a atenção dos membros do Conselho para a grandiosidade da construção e do sinal de progresso que aquele edifício traria para a vila de Curitibanos. Consoante o jornal, o discurso foi breve, mas enérgico e fez com que o povo vibrasse, aplaudindo-o. Em seguida, discursou o senhor engenheiro Emílio Bernardo Alberto Gischkow, eloquente orador, ex-promotor público de Lages, convidado para falar ao povo curitibanense sobre as suas impressões com relação ao novo edifício. Falou em nome do Partido Republicano Catarinense, fazendo o povo ter um sentimento de patriotismo devido às suas vibrantes palavras. Segundo ele, tal edifício foi construído pelo novo momento que o Brasil estava vivendo, a República. Segundo ele, somente através da observação da nova constituição de 1891, conseguiria produzir grandes feitos, ou obras tão grandiosas como aquela que estavam inaugurando, em Curitibanos, naquele dia. Dirigiu-se com os olhos voltados para os membros do Conselho, sendo aplaudido no final. Sobre Emílio Bernardo Alberto Gischkow, vale a pena esclarecer que o mesmo, também foi um dos responsáveis pela colonização de imigrantes em terrenos cedidos pelo governo estadual, ao longo da ferrovia São Paulo/Rio Grande.

Depois de diversos outros oradores, todos defendendo e pugnando as ideias exibidas anteriormente pelos primeiros oradores em prol da República e da forma republicana de governo, o Superintendente Municipal, senhor Henrique Paes de Almeida (Sênior), usou o tempo para confirmar o que já fora exaustivamente falado. Ele, após o seu breve discurso como mandatário de Curitibanos, encerrou com um simbólico brinde de honra ao Excelentíssimo governador do Estado de Santa Catarina, o lageano Felipe Schmidt.

Mesmo após o término da solenidade de inauguração da Casa da Câmara e Cadeia de Curitibanos, depois de oficialmente dissolvida a reunião, o povo continuou presente em forma de aglomerados ao redor da mesa do Conselho Municipal. Como foram vários os discursos em prol do sistema republicano, sendo o Superintendente do Partido Republicano Catarinense — PRC, sendo também o Governador do mesmo partido, vários correligionários, militantes e simpatizantes, desejaram dar suas simbólicas contribuições. Mesmo que fosse apenas como uma demonstração individualizada do entusiasmo, dedicação e lealdade à sustentação da ideia republicana.

Henrique Paes de Almeida (Sênior) era, naquela ocasião, além de Superintendente Municipal, o chefe do Partido Republicano Catarinense — PRC em Curitibanos. As despesas para a edificação do novo edifício, que tinha 60 palmos em cada uma das 4 faces, foram calculados em 9:300$000 (nove contos e trezentos mil réis). Se fosse construída atualmente, a obra passaria de 1 milhão de reais. Quanto às medidas, 1 palmo é igual a mais ou menos 22 centímetros, sendo aceito unanimemente, o arredondamento para 22 centímetros. Sessenta palmos nas 4 faces significam que o prédio da Casa da Câmara e Cadeia tinha 14 metros de largura, por 14 metros de comprimento. Era uma construção quadrada.

No dia da inauguração, várias pessoas, convidadas e simpatizantes, aderiram à causa republicana, filiando-se ao PRC, entre eles, os nomes de Manoel Granemann e João Goetten.

Esse edifício serviu aos administradores de Curitibanos, Henrique Paes de Almeida (Sênior) até o final da sua gestão, em 31 de dezembro de 1902. Francisco Ferreira de Albuquerque, de 1903 até meados de 1914. Marcos Gonçalves de Farias, até 26 de setembro de 1914, quando houve o ataque de mais de 200 homens fanatizados na vila de Curitibanos.

Naquele trágico dia 26 de setembro, a população estava muito assustada, principalmente, porque os homens que estavam sob o comando de Agustin Perez Saraiva, conhecido como “Castelhano”, fizeram muito barulho. Atacaram e incendiaram vários imóveis, inclusive, a Casa da Cadeia e Câmara. Hoje, restam apenas raras fotografias daquele edifício, que foi considerado um dos melhores do estado, quanto à sua finalidade.

Após esse ataque, Marcos Gonçalves de Farias somente assumiu o seu cargo de Superintendente Municipal no dia 12 de dezembro de 1914. Na ocasião, estava presente o então coronel do Exército, Newton Estillac Leal. A sede da superintendência funcionou temporariamente num teatro municipal. Somente em 1927, foi aberta uma licitação para a construção de uma nova e definitiva sede municipal.



Referências para o texto:


Curitybanos - Correspondência. O Dia. Orgão do Partido Republicano Catarinense. Florianópolis, terça-feira, 17 de setembro de 1901. Anno I, n.º 214, p. 3


Datas importantes na história de Curitibanos. On-line, disponível em: https://museuhistoricoantoniogranemanndesouza.blogspot.com/2021/05/datas-importantes-na-historia-de.html


LEMOS, Zélia de Andrade. Curitibanos na história do contestado. Edição do Governo do Estado de Santa Catarina, 1977. Curitibanos.


Lista de Governadores de Santa Catarina. On line: Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_governadores_de_Santa_Catarina


Lista de prefeitos de Curitibanos. On line: Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_prefeitos_de_Curitibanos


Os Fanáticos. Jornal A Federação. 13 de dezembro de 1914, p. 9


Santa Catarina — Resolução Ordinária Estadual n.º 4496/1895. Jornal República. Anno VI, n.º 12. Florianópolis, terça-feira, 15 de janeiro de 1895. P. 1.

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