segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

EM TEMPOS DE PIX

Texto de Antonio Carlos Popinhaki


Alguns poderão achar a presente história, cômica, hilária, dramática, e poderão associá-la, de forma reflexiva, bem como, os fatos aqui apresentados, com a realidade contemporânea, em tempos de inflação.

O PIX já produziu várias histórias. Algumas tristes, outras hilárias. Essa ferramenta, criada pelo Banco Central com a finalidade de facilitar as transações monetárias, já protagonizou diversas situações, dignas de registros. Os fatos deram-se em Curitibanos, nos dias que antecederam o Natal. Como é tradição, todos os anos, por volta dos dias 10 a 20 de dezembro, podendo variar conforme o calendário anual, a Prefeitura de Curitibanos financia e fomenta as atividades natalinas, como a visitação da casa do Papai Noel, atividades musicais e artísticas realizadas na concha acústica, passeio de jardineira, entre várias outras ações voltadas à época. Geralmente e tradicionalmente, as principais atividades ocorrem na Praça Centenário ou o “Parque do Capão” e também no seu entorno.

Aparecem, nesses dias quentes de verão, vendedores ambulantes de brinquedos, de espetinhos de carne (churrasquinhos de gato), vendedores de balões coloridos e outros vendedores ambulantes, com seus respectivos produtos, na maioria, de origem chinesa ou paraguaia.

Uma funcionária de um supermercado da cidade, solteira, de família ligeiramente enquadrada como classe média-baixa, arrumou um namorado. Este, é vendedor de carros, de uma garagem estabelecida numa das principais vias da cidade. Após algumas trocas de mensagens, certo dia de novembro, saíram para conversar pessoalmente. Marcaram para se encontrarem no Mercado Público, pois o lugar é ideal para isso, com uma infraestrutura adequada. No encontro, após demorada conversa, não se contiveram apenas nas informações e algumas histórias de suas vidas. Como tudo, nestes dias em que vivemos apressadamente, fruto do “progresso”, da tecnologia que nos serve e a servimos com a alimentação de informações, saíram do local após uma caneca de chopp para cada. Depois de várias carícias dentro do carro, acabaram indo para um motel no perímetro da rodovia BR-470.

Após este dia, devido ao aumento de trabalho no supermercado e também na revendedora de automóveis, ambos não saíram mais, nem marcaram encontro. Entretanto, trocaram várias mensagens diariamente. Os nomes de ambos foram preservados, pois Curitibanos é uma cidade pequena e não há nada que não seja mais prejudicial para alguém, quanto uma difamação alheia. Além disso, chacotas, bullyings, apelidos e os famosos “memes” fazem parte dos nossos dias. Não quero isso para nenhum dos dois. Também, por ética e entendimento da gravidade de um futuro problema, não divulgo no presente texto, os nomes dos estabelecimentos onde nossos personagens trabalham. Revelo, porém, que ambos estão numa faixa etária de 20 a 25 anos, com sonhos e projetos de planos para um futuro incerto.

No dia 16 de dezembro, estando na casa dos pais, à noite, a jovem mulher descansava, pois no dia seguinte teria que trabalhar no supermercado. O comércio estava aberto até mais tarde, devido à época do ano. Dessa forma, o trabalho também estava estendido. De repente, começaram trocar mensagens no celular:




Ela estava em casa, no conforto do seu lar, quase indo para a cama. Mas, com o convite inusitado e a insistência, resolveu ir, apesar de já ter jantado. Foram até o Parque do Capão e constataram que, realmente, havia muitas pessoas no local. Entre tantas, havia famílias visando aproveitar as atividades proporcionadas pela Prefeitura de Curitibanos. Elas tiravam fotografias com suas crianças, juntamente com o Papai Noel, numa casa de madeira, caracterizada especialmente para essa finalidade. Outras, estavam numa fila, esperando para poderem dar uma volta pelas ruas centrais num ônibus caracterizado para passeios, chamado de “jardineira”. 

Após comerem os espetinhos de carne, nosso casal aproveitou para enfrentar a fila e dar uma volta no ônibus. O trajeto todo durou cerca de 10 a 15 minutos. Como ambos precisavam trabalhar no dia seguinte, despediram-se do parque e retornaram para suas casas, passando primeiramente pela casa da jovem funcionária do supermercado. Quando chegaram em frente ao portão, o relógio marcava 22:30.

No dia seguinte, por volta das 8 horas da manhã, eis que surgiu nova mensagem no celular da jovem mulher, quando ela ainda estava na cama, pois o seu turno de trabalho era mais tarde. 




Ela, ao ler a curta mensagem, achou lindo, romântico, até comovente aquelas duas palavras. Pensou ela: “um homem que manda um bom dia, logo de manhã, deve ser uma pessoa sensível e amorosa”. Ledo engano! Mesmo antes de ela responder à mensagem com outro “Bom Dia!”, eis que surge na tela do seu celular outra mensagem:




Imediatamente, o conceito de homem romântico e amoroso foi alterado na sua mente. A resposta e a continuidade da conversa, a partir daqui, foi por gravação de áudio. Todavia, consegui transcrever:


— O quê? Você está me cobrando o espetinho que você disse que iria me pagar? Eu estava em minha casa, confortável, você me convenceu a ir ao parque, que iria me pagar, agora, está me cobrando?

— Sabe como é que é né amor, a gente está se conhecendo agora. É a segunda vez que a gente saiu né? Temos que dividir as despesas.

— Foi você que me chamou. Eu nem com vontade de sair estava, nem com forme estava, já havia jantado, fui por educação.


Depois de algum tempo, ela ponderou, pensou: “quer saber? Esse cara está tirando com a minha cara, fazendo graça comigo. Vou fazer o mesmo com ele”. Mandou logo nova mensagem de áudio:


— Faz o seguinte então, você desconta 200 reais do programa, depois me envia o restante por PIX.

— Que programa? Não sabia que você fazia programa? Pensei que você estava me dando por amor…

— Que amor? Te conheço há um mês. O país, em crise, acha que vou ficar dando por amor? Sai fora cara.

— Você tá doida? Tem que me avisar antes. 


A partir desse ponto, ela começou a ser incisiva e a próxima mensagem foi num tom ameaçador.


— Eu quero o PIX até hoje. Eu sei onde você trabalha e onde mora, vou até aí te infernizar, até que você me pague. Vou te passar a chave PIX, que é o meu CPF.


A partir dessa gravação, não houve mais mensagens, nem escrita, nem de voz. Como relatei no início, alguns poderão achar a presente história, cômica, hilária e mesmo dramática. Entretanto, serve para refletirmos sobre os atos impensados e feitos por impulso. Sobre as ações e as reações. Vivemos numa época em que temos dificuldades de confiar no semelhante. Já o fio do bigode não é garantia de comprometimento, de honra. Impulsos, emoções e atos impensados podem nos trazer complicações e difamações. Os cuidados, o auto policiamento, a precaução, a atenção e a razoabilidade precisam estar alinhados e de mãos dadas.

No caso do jovem casal, optei por deixá-los no anonimato, mas não me responsabilizo se, por parte de um deles, a notícia vazar e tornar pública, revelando, inclusive, seus nomes e os locais de trabalho.


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